Uma reflexão sobre prazos

Adriano Croco
5 min readJan 9, 2023

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Olá!

No texto de hoje eu gostaria de propor uma reflexão sobre o fatídico momento de estimar a entrega de uma tarefa.

Se você é um trabalhador digital, provavelmente alguém interessado no resultado do seu trabalho já te perguntou algo como:

E aí, quanto tempo você leva para fazer isso?

Ou também o famoso:

Quando fica pronto?

Ao ouvir essa pergunta, você pode ter se sentido desconfortável e apreensivo(a) de alguma forma. Após essa sensação inicial, você respira fundo e chuta, baseado em experiências anteriores similares.

Apesar de deixar claro que é apenas uma estimativa, caso você não cumpra o prazo por algum motivo fora do seu controle, isso será usado contra você no tribunal da gestão corporativa e seu gestor(a) provavelmente será acionado para lidar com a situação. Caso você seja o Líder responsável pela estimativa, dependendo da importância do projeto em questão, em caso de algum atraso possivelmente você estará sem vínculo empregatício no momento seguinte.

Dado esse contexto, vamos ao ponto principal que eu gostaria de abordar.

Antes até de sair chutando prazos (por mais critério que tentemos aplicar, sempre é um chute), recomendo pensar de outra forma. A resposta para perguntas dessa natureza deveria ser algo voltado para a análise de restrições envolvidas, priorização e se a tarefa deveria ser realmente feita. Para tal, perguntas como as abaixo poderiam ser feitas:

O que é o mais importante que o time deveria estar fazendo agora?

De onde vem essa urgência?

É importante para o negócio ou é só porque alguém do alto escalão quer o mais rápido possível?

Nesse último caso, existe uma disfunção documentada na comunidade ágil que chama Hippo (Highest Paid Person´s Opinion), ou seja, a opinião do chefe acaba sendo a que vale porque o salário dele é maior.

Quem nunca passou por uma dessa?

Caso a pessoa não consiga responder algumas das perguntas mencionadas e aplique pressão de alguma forma, é um indício de uma disfunção em gestão. Nesse caso, eu recomendo esse texto aqui, nele eu argumento o porquê ser uma má ideia aplicar pressão de uma maneira geral. Como complemento ao texto mencionando, gostaria de citar a Lei de Yerkes-Dodson.

Postulada em 1908, ela diz que há um limite ótimo para que o desempenho ocorra, baseado no stress aplicado em um determinado sistema. Acima desse limite, ocorre desgaste e frustração dos envolvidos. Todas essas ideias são resumidas na seguinte imagem:

Essa é a causa científica do seu burnout

Essa mesma ideia se aplica a fisiologia e a gestão de times. O único ponto que vale mencionar é que cada organismo ou pessoa possui um limite para a exaustão diferente.

Além disso, eu gostaria de discutir também a Teoria X e Y, de Douglas McGregor, que pode ser resumida em duas formas distintas de se enxergar a gestão de pessoas, resumida na seguinte imagem:

Diferenças entre a teoria x e y

Ou seja, a X é basicamente a origem do comando e controle e a Y é a origem do gerencie o sistema, não as pessoas (causa na qual eu sou adepto, inclusive).

Um outro nome para a Teoria X é Hipótese da Mediocridade das Massas. E esse nome diz muito sobre essas ideias, por incrível que pareça. Apesar dessas teorias terem sido postuladas na década de 50, é muito comum vermos hoje em dia conteúdo na internet que diz que o sucesso só depende de você, que os outros são medíocres e estão em situações ruins porque querem e similares. Em outros termos: Meritocracia é a solução para todos os problemas!

Basicamente, Teoria X, Meritocracia e o Discurso do Self-Made Human e similares, todos tem a mesma raiz: O capitalismo elevando o individualismo como solução de todos os problemas existentes e ignorando diversas outras variáveis relevantes.

O irônico disso tudo é que dado alguns vieses que todos temos (assunto já abordado aqui), tendemos a enxergar os outros como preguiçosos e a nós mesmos como vítimas das circunstâncias (ou seja, Teoria X para enxergar os outros e Teoria Y para auto-percepção).

Em última instância, quem pressiona por prazo está aplicando em você um conjunto de crenças e pressupostos totalmente enviesados. Dado que entender as causas não é o suficiente para resolver o problema, o que podemos fazer para agir de outra forma então?

Para ditar o tom, gostaria de mencionar a seguinte frase do cara que é tido como o Pai da Administração Moderna:

O Drucker não é tão citado a toa

Então a resposta para a pergunta sobre o prazo é outra pergunta: Estamos fazendo o que de fato deveria estar sendo feito?

Muitas vezes, ninguém sabe dizer, nem os executivos. Porque não é tão simples assim de se enxergar um caminho estratégico.

Com a premissa da Teoria Y, temos: se o time está trabalhando no que de fato é o que deveria estar sendo feito e as pessoas já estão dando o seu melhor, do que adianta pedir algum prazo? O trabalho ficará pronto quando estiver pronto. Cobranças dessa natureza são apenas mais uma forma de se adicionar stress a um sistema que as vezes já está a beira de um colapso.

Geralmente nessas situações, é gasto mais energia em controle (como status reports frequentes ou adição de mais pessoas) do que de fato com o trabalho que precisa ser feito. No final das contas, é uma receita para o que o trabalho atrase mais ainda (em computação, um postulado famoso relacionado é a Lei de Brooks).

Usando uma metáfora para concluir: O trabalho de um time é como se fosse uma máquina, você pode trocar peças, lubrificar as engrenagens ou até mesmo melhorar o processo de trabalho trocando a forma como a máquina trabalha e isso pode até funcionar, mas o que nunca vai funcionar é gritar com a máquina cobrando um bendito de um prazo.

Eu gostaria muito de ver mais empresas sendo geridas com técnicas eficazes e não na base de ansiedade de executivo.

Até a próxima!

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Adriano Croco
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