Um breve experimento mental

Adriano Croco
5 min readMay 31, 2021

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Olá!

Hoje eu quero contar uma história.

Imagine que você esteja sentado trabalhando na sua mesa na empresa (pode ser presencial, nesse caso) e tem em mãos uma bolinha de papel amassado.

Você já pensou no processo produtivo e na cadeia de pessoas envolvidas para que essa bolinha de papel chegasse até a sua mão?

Vamos começar do começo: de onde vem e como é feito o papel.

Embora eu não seja especialista em processos industriais, vou tentar preencher algumas lacunas com senso comum aqui.

Para iniciar o processo, é necessário extrair a celulose de algumas espécies de árvores específicas, certo?

Aqui já temos o primeiro grupo afetado no processo: os extratores de celulose. Nesse caso, são necessários pessoas engenheiras ambientais para pensar em uma plantação de árvores de forma sustentável. Aplicando todo o conhecimento em como escolher o terreno, água, quantidade de sol e uma infinidade de variáveis apenas para gerar uma maior produtividade por metro quadrado. Caso a empresa extratora seja meio errada, haverão extratores ilegais que irão derrubar vegetação nativa para extrair a celulose.

Nesse ponto, requer o uso de maquinário especializado, como colheitadeiras. Após a extração, há o transporte para a fábrica mais próxima, com o uso de caminhões ou ferrovias. E lembre-se: durante todo esse processo, há a necessidade de pessoas para operar todo esse maquinário. Que possuem custos fixos e variáveis, sonhos e problemas. Essas pessoas tem famílias, que também tem uma complexidade específica e podem ajudar ou atrapalhar os funcionários envolvidos na execução de suas atividades.

Agora, imagine o trabalho necessário e a complexidade aplicada em uma linha de produção que transforma celulose em papel em si. Ocorre a aplicação de conhecimentos advindos da engenharia, física, química e matemática, que, por sua vez, foram transmitidos em salas de aula para os profissionais envolvidos por professores que se aprenderam esses conceitos anteriormente, lendo o trabalho de humanos que muitas vezes viveram séculos antes. Imagine a quantidade de partes diferentes que precisaram se conversar para que uma pessoa engenheira de produção conseguisse simplesmente… se formar.

Imagine a quantidade de vezes que essa pessoa foi até a universidade, imagine o apoio (ou falta de) necessário da família para que a pessoa conseguisse se sustentar durante o período. Imagine a interação com os colegas, a pressão por notas, a quantidade de gasolina gasta no deslocamento (seja por ônibus ou carro próprio), quantidade de dinheiro gasto em comida, relacionamentos priorizados ou terminados que afetaram sua saúde mental, livros que leu e sentimentos envolvidos durante o processo de formação. Agora faça o mesmo exercício para os professores e demais profissionais envolvidos com o ecossistema de transmissão de conhecimento.

Agora, voltemos para a linha de produção.

Com o papel pronto, ele é preparado para a venda e embalado na fábrica antes de ser transportado para a loja mais próxima. Visualize o trabalho de pesquisa necessário e a quantidade de recursos usados para produzir uma embalagem de plástico que carrega 500 folhas de papel. Pense no processo produtivo do fornecedor de embalagens: pessoas envolvidas no fornecimento de matéria-prima, transporte, profissionais que trabalham na linha de produção, as pessoas que trabalham no alto escalão da gestão dessas empresas (seja do lado do fornecedor ou da fábrica que produz o papel).

No próximo passo, o papel chegou para a venda no estoque da papelaria no shopping próximo da sua casa ou no almoxarifado do escritório no qual você trabalha.

E como o papel chegou na sua mesa?

Alguém da sua empresa comprou. E de onde veio o dinheiro? Diretamente das operações relacionadas ao seu trabalho atual. Pensa que alguém tomou a decisão da compra, algum sistema processou essa compra (e fazer sistemas é meio complexo, lembra?) e mais algumas pessoas envolvidas (trabalhadoras da sua empresa ou terceirizados) foram encarregadas de transportar, organizar e aplicar mais algumas ações em cima dessas embalagens de papel, até que a embalagem chegasse no almoxarifado da sua empresa e fosse disponibilizado em algum canto do escritório.

E você — com seus problemas, sonhos e contas para pagar — pega essa folha de papel, rabisca algumas ideias soltas sobre o livro que está pensando em escrever ou sobre um problema da empresa que está tentando resolver, não gosta do resultado e simplesmente, amassa essa folha e joga no lixo ali do lado da sua mesa (que você ou alguém terá que retirar depois).

E para onde o papel descartado vai?

Da lixeira do seu escritório, vai ser encaminhado para a coleta de lixo usando sacos de lixo feitos de plástico (que também possuem sua complexidade produtiva específica) e que foram comprados por alguém e transportados até o escritório onde você trabalha está localizado. Pense em todo o processo envolvido na coleta do lixo da sua mesa, encaminhamento até a lixeira do prédio, escala de trabalho dos trabalhadores envolvidos e posterior coleta pelo serviço público da sua cidade, que provavelmente irá te cobrar uma taxa pela prestação dos serviços. Essa taxa irá aparecer (novamente, processada via sistema) em alguma conta que você vai pagar sem olhar o detalhamento dos serviços prestados, que você ou alguma pessoa da sua família vai pagar usando dinheiro, seja ganho através do trabalho ou advindo de aposentadoria — ganho através de décadas de trabalho honesto e contribuições ao INSS — imagine a quantidade de interações com outros atores que uma pessoa ativa no mercado de trabalho tem durante 30 anos!

Com o papel coletado e tratado, ele tem como destino final uma usina de reciclagem ou um lixão qualquer. Lugares que possuem trabalhadores envolvidos em fazer esse suposto lixo virar algo útil para a sociedade novamente. Imagine a tecnologia envolvida, a condição de trabalho de pessoas que trabalham catando lixo no lixão, as doenças que elas podem pegar. Imagine a poluição ambiental ou trabalhar tentando coletando algo de valor no meio de algo que foi descartado por outras pessoas, imagine o odor, o chorume, os ratos e urubus passando ao lado dos seus pés o tempo todo. Você já se imaginou trabalhando em um lixão? Na insalubridade envolvida? Na falta de garantias mínimas?

E temos o fim do ciclo de vida da bolinha de papel.

Para finalizar, pense que qualquer uma das múltiplas variáveis mencionadas no exemplo sofreram alguma alteração, qual o impacto no sistema como um todo?

Tá, mas qual é a moral da história?

Ambientalismo? Capitalismo? Mais-valia? A mão invisível do mercado cuida de tudo? Meritocracia? Desigualdade social? Otimização global é melhor que o ótimo local?

Podem ser todos esses (e até mais alguns) argumentos se você quiser pensar sobre isso, só dependendo do seu grau de conhecimento prévio e capacidade de fazer conexões com o texto mencionado com outros assuntos previamente conhecidos.

Mas o meu intuito é mais simples que isso: não importa o tamanho da ação, seja grande ou ínfima, ela sempre terá uma consequência, por mais que sua consciência não a perceba. Portanto, sabendo disso, te proponho a seguinte reflexão: você sabe qual o impacto das suas ações no mundo? E sendo líder, qual o impacto das suas ações (mesmo as pequenas) na sua equipe?

Até.

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Adriano Croco
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