Cultura organizacional: dicas práticas de como sofrer menos com ela

Adriano Croco
5 min readJun 2, 2022

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Olá!

Hoje eu gostaria de resumir alguns pontos sobre cultura organizacional que andei estudando nos últimos tempos. Acredito que possa ajudar alguém a entender melhor algumas dinâmicas corporativas.

Para começar essa discussão, gostaria de citar a seguinte definição de cultura organizacional, proposta pelo Edgar R. Schein, do MIT (grifos meus):

Cultura Organizacional é o padrão de pressupostos básicos que um dado grupo tem inventado, descoberto, ou desenvolvido durante seu processo de aprendizado para lidar com seus problemas de adaptação externa e integração interna, e que têm funcionado bem o bastante para ser considerado válido, e, portanto, para ser ensinado para novos membros como a forma correta para perceber, pensar e sentir em relação a esses problemas. Fonte.

Vamos analisar esse parágrafo com calma.

É possível inferir a partir dessa definição que a cultura de uma empresa surge de uma lógica de tentativa e erro por parte dos fundadores. O que funciona, é passado adiante. O que não funcionou para aquele ecossistema em algum momento, é descartado. Isso se repete até chegar na famosa frase (que você provavelmente já deve ter ouvido de alguém na sua carreira): É assim que as coisas são feitas por aqui.

O grande problema é quando você adentra um ecossistema e quer fazer diferente. Nesse caso, acontece algo parecido com o vídeo abaixo:

Vídeo de um experimento que serviu de base para estudos de cultura organizacional

O que esse experimento mostra é que quem tenta fazer as coisas contra a forma de pensar dominante acaba impactado por esse medo do diferente de uma forma que até mesmo os inovadores convictos se resignam e deixam de tentar. Ou seja, é uma espécie de se eu não posso, você também não pode. Nada mais mesquinho que isso. É a lógica do: a pessoa nasce boa, é a cultura que a corrompe. Depois as pessoas se perguntam porque a inovação não ocorre nas empresas, dado que toda iniciativa e vontade de fazer diferente é punida, explicita ou sutilmente.

E fica ai o questionamento: Será que os problemas que enfrentamos como cidadãos brasileiros não ocorrem justamente porque punimos quem tenta fazer diferente?

Análises sociológicas de botequim a parte, continuemos o texto.

Para tentar entender melhor quais são as culturas possíveis, eu gosto de usar modelos que expliquem a realidade. Apesar de todo modelo ser reducionista em algum grau (ainda mais em se tratando de algo que tenta classificar relações humanas), acredito que usar algum modelo seja melhor do que não usar nada.

Um que me deparei recentemente nas minhas pesquisas foi o Competing Values Framework (CVF), que separa as culturas em quatro tipos que competem entre si, o que fica mais ou menos parecido com isso:

Matriz dos valores CVF

Pela matriz CVF, Competição é o oposto de Colaboração. Controle é o oposto de Criação.

Mas não só isso! Vamos parar para analisar um pouco essa matriz porque dá para obter vários insights legais sobre isso. Vou detalhar um pouco cada quadrante, acho que irá facilitar o entendimento do modelo:

Collaborate: É uma organização que preza muito por grupos (clãs) colaborando entre si. Geralmente, é uma cultura que se preocupa mais com os problemas internos e com visão de longo prazo, incentivando alinhamento e propósito. Tem como valores positivos a colaboração, equilíbrio entre vida pessoal e profissional e relações autênticas. Como ponto negativo, pode ser um ambiente em que reina a indecisão (dado o excesso de democracia) e ter uma tendência a evitar conflitos necessários. Em um caso extremo, pode vir a ser um country club irresponsável, no qual só se discute e não decide nada. Aqui, líderes com perfil agregadores e conselheiros se saem muito bem nesse tipo de cultura. O lema é fazer junto.

Create: Também chamadas de Adocracia. São culturas voltadas para inovação e bastante dinâmicas. Tem como principal motor o aprendizado e prazer em fazer. Os valores positivos são o foco em crescimento, auto organização das pessoas e ação criativa. No lado negativo, gera desperdício, intensidade cega e confusão, pois muitos projetos competem entre si sem muito foco. Os líderes que se dão bem nesse tipo de cultura são os líderes confiáveis, pois dado que é uma cultura orientada para o mundo externo, essa confiabilidade na entrega dos líderes é muito necessária. Um outro valor muito forte é autonomia. Aqui, o lema é fazer primeiro. No pior cenário, é uma anarquia tumultuosa em que o foco nunca acontece.

Control: Os principais valores são ordem e segurança. É possível encontrar foco em processos internos e na manutenção do status quo. Os valores positivos são um bom controle de custos, previsibilidade e bom controle gerencial. Como valores negativos, é possível encontrar microgerenciamento, cinismo e austeridade, dado que tudo tem que ser feito em cima de processos estruturados. Líderes democráticos agregam positivamente nesse tipo de cultura, dado sua capacidade de ouvir o time. O lema é fazer certo. No pior cenário, é uma burocracia sufocante em você gasta mais tempo lidando com processos do que produzindo de fato.

Compete: Os principais valores são resultado e autoridade. Possui foco em competição e independência, com uma visão de curto prazo. Os valores positivos são confrontação construtiva, foco em resultado e e responsabilização individual. No lado negativo, é possível citar interesse próprio, conflito e exaustão das pessoas. Líderes agressivos e coercivos se saem bem nesse tipo de cultura. O lema é fazer rápido. No pior cenário, é um lugar escravizante-opressivo.

Aqui cabe um detalhe que achei curioso: qualquer tipo de líder é considerado positivo em qualquer tipo de cultura na literatura que encontrei, exceto líderes agressivos e coercivos. Eles se saem bem em culturas de competição, mas onde tocam, eles entregam resultados em troca de sangue e sofrimento das pessoas envolvidas. Achei interessante pesquisas sérias em administração confirmarem a minha seguinte percepção: Ser escroto não vale a pena no final.

Minha dica aqui é: se você sabe qual é o seu perfil, basta agora descobrir com algumas perguntas simples qual é a cultura da empresa e com o que você se identifica. Repetindo uma frase que já mencionei em artigos anteriores: promoção é aderência a cultura. Logo, se você gosta de colaboração, você pode ter problemas em se adaptar a culturas competitivas. Se você gosta de inovação, talvez empresas em mercados muito regulados e cheio de processos não sejam o ideal para você. Entender isso me fez entender melhor muitos conflitos que tive na minha carreira. Espero que te ajude também!

Entender o CVF me fez ter o seguinte entendimento (libertador, para dizer o mínimo): Você não precisa estar aderente a todas as empresas, e sim, somente as que ressoam com os seus valores. Tentar se encaixar em algum lugar com valores muito diferentes do seu é uma forma de sofrer sem necessidade. E não existe carreira que progrida sem essa aderência entre os valores do profissional e da empresa.

Infelizmente, o mesmo alinhamento serve para o mal. Se a gestão é tóxica e ninguém faz nada, é porque a empresa quer que isso ocorra, afinal — voltando lá na definição de cultura — é o que a liderança aprendeu que funciona no passado e foi mantendo esse comportamento ao longo do tempo. Nesse exemplo, só te resta duas escolhas: se corromper e a abraçar a toxicidade (podendo até ser promovido(a) no processo) ou sair e procurar algum lugar mais aderente.

Espero que esse texto tenha sido útil para que uma próxima vez, você possa escolher melhor quais batalhas você irá travar na sua carreira.

Até!

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